Depressão e Transtornos do Humor
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Dr. Marcos Fogarella
12/26/20155 min read


Depressão e Transtornos de Humor: Uma Conversa Franca
Sabe aquela sensação de que algo não está certo, mas você não consegue colocar o dedo exatamente onde? Ou quando a tristeza deixa de ser apenas um sentimento passageiro e se instala como uma companhia indesejada que simplesmente não vai embora? É por aí que começamos a entender o que são os transtornos de humor.
O Que Realmente Acontece no Cérebro
Vamos direto ao ponto: depressão não é frescura, preguiça ou falta de força de vontade. É uma condição médica real, com alterações neurobiológicas concretas. Quando falamos de transtornos de humor, estamos nos referindo a um grupo de condições que afetam principalmente a forma como nos sentimos emocionalmente - e isso tem tudo a ver com a química do nosso cérebro.
Pense nos neurotransmissores como mensageiros químicos que levam informações de um neurônio para outro. Na depressão, três desses mensageiros ficam especialmente comprometidos: a serotonina (que regula humor, sono e apetite), a noradrenalina (ligada à energia e atenção) e a dopamina (relacionada ao prazer e motivação). Quando esses sistemas não funcionam direito, é como se as mensagens importantes do cérebro ficassem perdidas no caminho.
Mas não para por aí. Pesquisas mais recentes mostram que a depressão também envolve inflamação cerebral, alterações na neuroplasticidade (a capacidade do cérebro de se reorganizar) e até mudanças no volume de certas áreas cerebrais, como o hipocampo e o córtex pré-frontal.
Depressão Não É Uma Coisa Só
Aqui está algo que muita gente não sabe: existem vários tipos de transtornos de humor, cada um com suas particularidades.
A depressão maior é aquela que a maioria das pessoas conhece - ou acha que conhece. Não é só "estar triste". É uma tristeza profunda, persistente, que vem acompanhada de perda de interesse em praticamente tudo que antes trazia prazer. A pessoa pode dormir demais ou não conseguir dormir, perder ou ganhar peso sem querer, sentir uma fadiga constante e, nos casos mais graves, ter pensamentos sobre morte ou suicídio. Para o diagnóstico, esses sintomas precisam estar presentes por pelo menos duas semanas e causar prejuízo significativo na vida da pessoa.
O transtorno bipolar é outro bicho completamente diferente. Aqui, a pessoa alterna entre episódios depressivos e episódios de mania ou hipomania. Na mania, há uma elevação anormal do humor, aumento de energia, diminuição da necessidade de sono, pensamentos acelerados, comportamentos impulsivos. É como se o cérebro entrasse em modo turbo - mas não de uma forma boa ou produtiva. Muita gente confunde com "altos e baixos normais", mas a diferença está na intensidade e no prejuízo que causa.
A distimia, ou transtorno depressivo persistente, é como uma depressão de baixa intensidade que dura anos. Não é tão intensa quanto a depressão maior, mas é crônica, persistente. A pessoa vive com aquela sensação de que "é assim mesmo", de que a vida é meio cinza, sem brilho.
Por Que Algumas Pessoas Desenvolvem e Outras Não?
Essa é a pergunta de um milhão de dólares, não é? A resposta é: é complicado. E multifatorial.
Existe sim um componente genético importante. Se você tem parentes de primeiro grau com depressão, seu risco aumenta cerca de 2 a 3 vezes. Mas ter a predisposição genética não é uma sentença - é mais como ter uma vulnerabilidade que pode ou não se manifestar dependendo de outros fatores.
O ambiente conta muito. Traumas na infância, estresse crônico, perdas significativas, situações de violência ou abuso - tudo isso pode alterar a forma como nosso cérebro responde ao estresse ao longo da vida. Há estudos mostrando que o estresse precoce pode literalmente modificar a expressão de certos genes (isso se chama epigenética) e afetar o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, nosso sistema de resposta ao estresse.
E tem mais: fatores como doenças crônicas, uso de certas medicações, desequilíbrios hormonais, deficiências nutricionais e até a saúde do nosso intestino (sim, o eixo intestino-cérebro é real!) podem influenciar.
Os Sinais Que Merecem Atenção
Olha, todo mundo tem dias ruins. Dias em que acordamos meio pra baixo, sem muita vontade de fazer nada. Isso é normal e faz parte da experiência humana.
O problema é quando isso se torna a regra, não a exceção. Quando a tristeza ou o vazio se instalam e não vão embora. Quando você perde o interesse em coisas que sempre amou fazer. Quando o cansaço é tão grande que até tomar banho parece uma tarefa hercúlea. Quando você começa a se isolar, a evitar as pessoas, a sentir que é um peso para os outros.
Outros sinais importantes: alterações no sono (insônia ou sono excessivo), mudanças no apetite e peso, dificuldade de concentração, sentimentos de culpa ou inutilidade excessivos, irritabilidade aumentada, sintomas físicos sem explicação médica (dores, problemas digestivos) e, principalmente, pensamentos sobre morte ou suicídio.
Se você ou alguém próximo está passando por isso, procurar ajuda não é sinal de fraqueza - é sinal de inteligência emocional.
O Tratamento Funciona (Sério!)
Aqui vai uma boa notícia: transtornos de humor são tratáveis. Muito tratáveis, inclusive.
O tratamento geralmente envolve uma combinação de abordagens. A psicoterapia, especialmente a terapia cognitivo-comportamental (TCC) e a terapia interpessoal, tem eficácia comprovada em diversos estudos. Essas terapias ajudam a pessoa a identificar e modificar padrões de pensamento e comportamento que mantêm a depressão.
Os antidepressivos funcionam corrigindo os desequilíbrios de neurotransmissores. Existem várias classes - inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), inibidores de recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSNs), entre outros. Não, eles não causam dependência. Não, eles não mudam sua personalidade. Eles ajudam o cérebro a funcionar melhor.
E tem mais: mudanças no estilo de vida fazem diferença real. Exercício físico regular tem efeito antidepressivo comprovado (aumenta neurotransmissores e fatores neurotróficos). Sono adequado, alimentação balanceada, exposição à luz solar, conexões sociais - tudo isso importa.
Em casos mais graves ou resistentes, existem outras opções como estimulação magnética transcraniana, eletroconvulsoterapia (que é muito diferente daquelas imagens antigas de filmes) e, mais recentemente, até mesmo ketamina e psilocibina em contextos controlados.
Uma Última Palavra
Depressão e transtornos de humor não definem quem você é. São condições médicas que afetam o funcionamento do cérebro, assim como diabetes afeta o pâncreas ou hipertensão afeta o coração. E assim como essas condições, podem e devem ser tratadas.
Se você está passando por isso, saiba que não está sozinho. Milhões de pessoas ao redor do mundo enfrentam essas condições. E com o tratamento adequado, a grande maioria melhora significativamente.
A jornada pode não ser linear - pode haver altos e baixos - mas há esperança real e concreta de recuperação. O primeiro passo é sempre o mais difícil: reconhecer que algo não está bem e buscar ajuda. Mas esse passo pode fazer toda a diferença.
